20/06/2008

> FINALMENTE, ENFURECI!> > Waldo Luís Viana*> > Acordei de madrugada, neste outono de terremoto, a pensar> sobre o que aconteceu realmente em meu país. Todo mundo já disse tudo.> A imprensa golpista, a imprensa esquerdista que não se diz golpista> (aliás que caricatura grotesca o esquerdismo a favor!) – e fiquei> matutando: o que nos aconteceu?> > Os políticos continuam os mesmos, safados, entre uísques,> interesses e amantes, procurando os seus cadinhos, como moscas em> volta das fezes do poder. Uma Pátria dirigida por pútridos, em> sucessão de escândalos que não dá pra registrar, empreiteiros,> bicheiros, lobistas, vigaristas, assessores, falsos empreendedores com> escritório de fachada, amantes em busca de carteiras gordas e uma> gravidez premiada, traficantes pequenos e grandes, a cocaína e a> prostituição à solta, a pornografia invadindo os olhos dos nossos> filhos pela internet e a corrupção vitoriosa, tão inexcedível em seu> poder de persuasão, que os corruptos levam os filhos de carro blindado> para a escola e seus netos serão inevitavelmente chacinados por> alguém, desesperado, que o gordo, careca, de terno cinza e gravata> vermelha, com certeza no passado prejudicou...> > O que aconteceu neste país que nossos vizinhos querem tomar> nossas riquezas e os índios e ONGs estrangeiras nossos territórios e> minerais? Onde generais, sempre ciosos do respeito à hierarquia,> acalmam as suas mulheres nos travesseiros noturnos, dizendo que com> certeza virá o próximo aumento para a tropa? E olha que mulher de> militar é fogo, hein, tem coragem...> > O Brasil, como dizia o velho general Golbery é um barril de> pólvora. E dizia mais: entre sístoles e diástoles vamos desdobrando> nosso vil destino, enquanto as maiorias não cobram o seu quinhão.> Esperemos, pois, que a Rocinha desça um dia e tome São Conrado, onde> reside o Sr. César Maia e outros que tais. Vai ser uma novela da Rede> Globo. Ainda bem que o Projac fica mais longe...> > Cá estou eu, diante do computador que ainda me resta, pensando> em meu país, sem dormir, como o velho seringueiro de Mário de Andrade.> De que adianta pensar que minha filha está longe e se atravessar minha> cidade de madrugada possa levar uma bala perdida? E o festival em> torno da morte da menina Isabella? A mãe verdadeira já está sendo> envolvida por duplas caipiras e talvez se torne artista do próximo Big> Brother...> > Tudo nessa terra é banalização. Vivemos a morte bem morrida da> ética. Eu também tenho os meus pecados, como cruel mortal, mas diante> do que vejo, das carnificinas, das bocas de fumo, dos caveirões e> fuzis AR-15, sou reles e ingênuo inocente.> > Escritor e poeta com tantos livros a publicar, outros no> estrangeiro porque minha gente não me deseja ler, porque não apanhei> da ditadura (tinha quinze anos quando ela explodiu) e não posso nem> requerer indenização...> > O que aconteceu, meu Deus, a meu país, em que as mulheres> precisam tirar a roupa para subir na vida e encontrar um figurão para> escorar o divórcio. Em que as prostitutas são seres dos mais nobres> porque fazem distribuição de renda: tiram dos homens mais velhos o> dinheiro que revertem para os filhos mais novos, que não pediram para> nascer...> > E nossos aposentados, roubados a cada dia em seus proventos de> vento, não podem recorrer a ninguém, já sem forças. Os que lhes> esmagam serão velhos um dia também, mas vivem da esperança de> repatriar o dinheiro de paraísos fiscais, onde os brasileiros detêm> 150 bilhões de dólares e não receiam qualquer guerra e, no íntimo,> fazem previsão meteorológica de que jamais haverá um tsunami no> Caribe...> > Nossos juros, os mais altos do planeta, para conter o egoísmo> da inflação produzido por nossas elites. Nenhuma idéia nova. Só a> mesma ortodoxia econômica da Escola de Chicago. Como se o sol nascesse> a cada dia por causa do Itaú, do Bradesco e do Banco de Boston. Essas> instituições não valem a beleza de um carvalho, nem o pescoço de uma> vaca pendido no pasto...> > O Brasil da dengue, dos seios siliconados, da febre amarela,> do carnaval do abadá e do rouba-cá, das geladeiras novas do> bolsa-família para poupar energia, enquanto entregamos Itaipu para o> falsificado irmão Paraguai, da solidariedade latino-americana que é> sempre contra nós, dos norte-americanos que ainda pensam que comemos> bananas e temos cobras pelas ruas passando entre tiros de fuzil, pobre> Brasil, em que os poetas não estão nas praças públicas, mas> trombadinhas e mulheres grávidas morrem nas portas dos hospitais> públicos, aqueles da saúde quase perfeita.> > Afinal temos um PAC de placas, discursos e pedras> fundamentais, pastores bandidos que devem ao fisco e não podem ser> investigados porque têm bancadas parlamentares, um congresso fascista,> movido a facções profissionais como queria Mussolini, e uma falsa> esquerda, sempre ética antes de chegar ao poder e coberta de dossiês e> socialismo de mercado quando encontra com ele. Pobre país em que temos> quase 50 ministros, como na extinta União Soviética e 22 mil cargos de> confiança, como em qualquer ditadura africana.> > Onde isso tudo vai acabar? Em nada. Na minha cama, Para onde> irei como sempre, assustado, à espera do efeito do calmante...> > * Waldo Luís Viana é escritor e economista.> > Rio de Janeiro, 24 de abril de 2008.